Valinhos

 

 

Quarta Aparição de Nossa Senhora nos Valinhos

 a 19 de agosto de 1917
Luciano Cristino
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CRISTINO, Luciano – Quarta aparição de Nossa Senhora nos Valinhos a 19 de agosto de 1917. Em VAZ, Carla Abreu, coord. – Santificados em Cristo: Itinerário Temático do Centenário das Aparições de Fátima: 5.º ciclo. Fátima: Santuário de Fátima, 2014. p. 49-60.
Estudos
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Lúcia, Francisco e Jacinta, pastorinhos de Fátima, regressados de Vila Nova de Ourém, depois de o Administrador do concelho os ter levado, no próprio dia 13 de agosto de 1917, tiveram a quarta aparição de Nossa Senhora.
1. DATA DA APARIÇÃO Desde o ano de 1917, têm sido apresentadas várias datas desta aparição. O interrogatório de 21 de agosto, do Padre Manuel Marques Ferreira, pároco de Fátima, esclarece: “Disse Lúcia que viu Nossa Senhora, no domingo a seguir ao dia 13”1, isto é, a 19 de agosto. O Padre António dos Santos Alves, pároco das Cortes, Leiria, interrogou as videntes Lúcia e Jacinta, quando estiveram na Reixida, da mesma freguesia, entre 14 e 27 de setembro de 1917, e datou, num primeiro depoimento2, a aparição no dia 18 de agosto; num segundo depoimento, corrigiu: “no domingo imediato ao dia 13 de agosto”3. No primeiro interrogatório do Dr. Manuel Nunes Formigão, a 27 de setembro de 1917, Lúcia respondeu: “Nesse mês [de agosto], vi-a só alguns dias depois [de 13 de agosto], a dezanove”4. Leonor de Avelar e Silva Constâncio, que assistiu ao interrogatório do Dr. Formigão, em 19 de outubro de 1917, refere: “Soubemos depois que as crianças […] diziam ter sido no dia 19 [de agosto], favorecidas com nova aparição”5. Maria da Conceição Stokler Parente, de Alcobaça, em carta de 16 de outubro de 1917, publicada em “A Ordem”, a 27 do mesmo mês, diz: “No dia 19 [de agosto], apareceu Nossa Senhora às ditas crianças, noutro lugar”6. No dia 2 de
novembro, o Dr. Formigão interrogou a Lúcia, a Jacinta e o João Marto: “Que disse ela no domingo
1 DCF 1, 1.ª edição, Fátima, 1992, Doc. 4, de 21 de agosto de 1917, p. 17. 2 DCF 1, Doc. 44, depois de 17 de setembro de 1917, p. 318. 3 DCF 1, Doc. 45, depois de 17 de setembro de 1917, p. 322. 4 DCF 1, Doc. 7, de 27 de setembro de 1917, p. 53. 5 DCF 3-1, Doc. 129, de depois de 19 de outubro de 1917, p. 339. 6 DCF 3-1, Doc. 211, de 27 de outubro de 1917, p. 504.
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seguinte [ao dia 13 de agosto], quando te apareceu no sítio dos Valinhos?”7. No estudo psicológico sobre os videntes, o mesmo Dr. Formigão afirma: “A 19 de agosto, no sítio dos Valinhos, a Senhora aparece-lhes improvisamente [sic]”8. Maria Augusta Saraiva Vieira de Campos, em A Minha peregrinação a Fátima, publicado nos finais de novembro de 1917, diz a mesma coisa: “No domingo imediato, 19 de agosto, a criança pediu à Senhora a não deixasse ficar por mentirosa, no dia 13 de outubro”9. O “Boletim Popular”, de Matosinhos, publicou, em dezembro de 1917, um artigo sobre os acontecimentos de Fátima, em que se afirma: “No dia 19 [de agosto], apareceu Nossa Senhora às ditas crianças, em outro lugar”10. A 6 de agosto de 1918, data final do processo paroquial de Fátima, o pároco repete o que tinha escrito em 1917: “No dia dezanove, que fora domingo, andava a pastorear as ovelhas, no sítio chamado Valinhos”11. O Dr. Formigão, no opúsculo, Os episódios maravilhosos de Fátima, com imprimatur a 16 de junho de 192112, e em Os acontecimentos de Fátima, de 18 de março de 1923, continua a datar a aparição a 19 de agosto13.
A partir de 1922, Lúcia parece inclinar-se para outro dia, no seu escrito do Vilar, Porto: “Assim se passaram três dias [em Vila Nova de Ourém]. […] Então vieram-nos pôr em casa do Senhor Prior. Chegando a nossa casa, fomos logo pastar as ovelhas para um sítio chamado Valinho. […] Chegando a Jacinta, deu um relâmpago e apareceu a Senhora em cima duma carrasqueira14.
Quando Lúcia foi ouvida, no Porto, em 8 de julho de 1924, pela Comissão Canónica Diocesana, no depoimento que foi redigido em terceira pessoa, diz-se: [No dia 13, o administrador] “interrogou-as na administração; depois, levou-as para casa dele […]. Que no dia seguinte [dia 14], uma senhora de idade as interrogou sobre o segredo […]. Levaram-nos para casa do administrador e lá ficaram aquela noite no mesmo quarto. No dia seguinte [dia 15], foram à administração, interrogatórios de manhã e de tarde; à noite desse dia, ficaram lá e, no outro dia [dia 16], pelas 10 horas, de novo à administração, mandou-os sentar no carro e, no dia 15 [sic], foram para casa, com o administrador, a casa do prior, deixando-os na varanda. O povo fez muitas perguntas. Quando chegaram a casa, receberam ordem de ir para os Valinhos e ali, nesse mesmo dia, se deu a aparição, também sobre uma carrasqueira”15. Nesta versão, acrescenta-se mais um dia ou dois.
No depoimento da mesma data, redigido em primeira pessoa, Lúcia exprime-se assim: “Quando chegámos a Ourém [dia 13], fecharam-nos num quarto […] No dia seguinte [dia 14], uma senhora de idade interrogou-nos sobre o segredo; depois, levaram-nos para a administração, onde fomos de novo in
7 DCF 1, Doc. 17, de 2 de novembro de 1917, pp. 169, 170 e 179. 8 DCF 1, Doc. 19, depois de 3 de novembro de 1917, p. 194. 9 DCF 1, Doc. 42, de 23 de novembro de 1917, p. 306. 10 DCF 3-1, Doc. 353, de dezembro de 1917, p. 815. 11 DCF 1, Doc. 31, de 6 de agosto de 1918, pp. 262-263. 12 DCF 3-3, Doc. 621, de 16 de junho de 1921, p. 121. 13 DCF 4-2, Doc. 256, de 18 de março de 1923, p. 161. 14 DCF 3-3. Doc. 685, de 5 de janeiro de 1922, p. 268. 15 DCF 2, Doc. 7, de 8 de julho de 1924, pp. 129-130.
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terrogados […]. Voltámos para casa do Senhor Administrador onde tínhamos ficado na noite anterior e, de tarde, fomos outra vez interrogados sobre o segredo. Levaram-nos à cadeia e ameaçaram-nos de lá ficar, se o não disséssemos. Tornámos para a administração, e como não disséssemos o segredo, prometeram que nos iam fritar com azeite […]. Levaram-nos para casa do Administrador, e lá ficámos aquela noite no mesmo quarto. No dia seguinte [dia 15], foi quase a mesma coisa: interrogatórios de
manhã e à tarde, com muitas promessas e ameaças. No dia dezasseis, fomos outra vez à Administração, pelas dez horas, mas nada conseguiram de nós, como das outras vezes. Então o Senhor Administrador mandou-nos seguir para um carro, e deixou-nos em casa do Senhor Prior, na varanda. Chegando a nossa casa, fomos logo com as ovelhas para um sítio chamado Valinho, na companhia do Francisco e do João. […] Quando chegou a Jacinta, disse-lhe que tinha dado um relâmpago e que provavelmente a Senhora ia aparecer. Descemos por um atalho, e vimos a Senhora, em cima duma azinheira”16. Nesta versão, acrescenta-se mais um dia.
No dia 28 de setembro de 1923, Manuel Pedro Marto, Olímpia de Jesus, Maria Rosa e Maria dos Santos ou Maria Carreira, ouvidos pela Comissão Canónica Diocesana, exprimiram-se, respetivamente: “no dia 19 de agosto”, “no dia 19 era um domingo”, “no dia dezanove” e “nos Valinhos, quando se deu a aparição, a dezanove do mesmo mês”17. Damos a palavra à Senhora Maria Rosa, mãe de Lúcia: “O administrador veio trazê-los à Fátima, no dia 15 [de agosto], num carro e foi pô-los à varanda do Senhor Prior […]. No dia dezanove, a Lúcia chegou a casa, à noite, trazendo na mão um raminho de azinheira e disse que Nossa Senhora lhe tinha aparecido, um pouco antes do sol posto, aí pelo meio da tarde, às quatro horas, tendo estado, ao meio-dia, com o gado em casa. A mãe pegou no ramo e notou que cheirava muito bem. O cheiro não se podia comparar com nenhum outro cheiro. Ela era descrente e ficou um pouco quebrada, um pouco mais convencida. Disse a filha que a Senhora tinha dito que continuassem a ir à Cova da Iria e que havia de fazer um milagre em outubro, na Cova da Iria, que os militares haviam de vir da guerra, que havia de vir Nossa Senhora das Dores e outras coisas mais”18.
No relatório da Comissão Canónica Diocesana, aprovado em sessão de 13 e 14 de abril de 1930, dizse que as aparições foram todas no dia 13, de maio a outubro, “exceto em agosto, que se realizou, alguns dias depois, segundo parece, no dia 16”19. E a Carta Pastoral de D. José Alves Correia da Silva evitou a indecisão e indicou simplesmente “alguns dias depois” de 13 de agosto20.
Na sua Segunda Memória, de 21 de novembro de 1937, a Irmã Lúcia diz que a aparição de agosto, “a
16 DCF 2, Doc. 8, de 8 de julho de 1924, pp. 142-143. 17 DCF 2, Doc. 4, de 28 de setembro de 1923, pp. 68, 79, 91 e 108. 18 DCF 2, Doc. 4, de 28 de setembro de 1923, p. 91. 19 DCF 2, Doc. 9, de 13 e 14 de abril de 1930, p. 163. 20 DCF 2, Doc. 11, de 13 outubro de 1930, p. 268.
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meu ver, foi no dia 15 de agosto”21. Na Quarta Memória, terminada a 8 de dezembro de 1941: “Dia 13 de agosto de 1917 – Como já está dito, o que, neste dia, se passou, não me detenho nisso e passo à aparição, a meu ver no dia 15, ao cair da tarde. Como ainda então não sabia contar os dias do mês, pode ser que seja eu a que esteja enganada; mas conservo a ideia que foi no mesmo dia em que chegámos de Vila Nova de Ourém”22.
Conhecida, depois de maio de 1942, a Quarta Memória da Irmã Lúcia (terminada em 8 de dezembro de 1941), Maria de Freitas entrevistou Teresa de Jesus, irmã de Lúcia, sobre o assunto. – “E no dia 19?” – “Não posso dizer se foi no dia 19, mas o que posso afirmar com toda a certeza é que a aparição dos Valinhos foi num domingo ou dia santo de guarda”. – Pois o dia 19 de agosto de 1917 foi um domingo!” – “Então seria isso... O que sei de certeza é que vim à Missa à Fátima com o meu José e de lá acompanhámos com a minha Lúcia, a Jacinta e o Francisco à Cova da Iria, para rezarmos o terço. Nisto, o Sr. José Alves, da Moita, que também por cá apareceu, levou-os consigo e lá lhes deu de jantar [almoço]. Eu voltei com o meu homem e até fomos jantar [almoçar] a casa da minha mãe que ficou toda “acelerada”, por a Lúcia não ir, com medo que ela não chegasse a horas de abrir o gado. Jantámos [almoçámos], estivemos por ali um bocado, e nisto chegaram a Lúcia, o Francisco e mais o João, irmão deste. Perguntámos-lhes pela Jacinta, e eles disseram que, ao passarem lá por casa, a tia Olímpia a não tinha deixado seguir, porque a queria catar.
A minha mãe mostrou-se satisfeita por a Lúcia chegar a tempo de levar o gado, e lá foram todos três para os Valinhos. Daí a pouco, eu segui também com o meu José para a minha casa, mas quando passámos à porta da tia Olímpia, entrámos a fazer-lhe uma visita. Estávamos lá, e a cachopita já a brincar por ali, quando chega o Francisco [isto é, João] muito acelerado...”. “Chamava pela Jacinta que fosse já com ele, que a Lúcia a mandava chamar porque Nossa Senhora lhes ia aparecer”. “A mãe não a queria deixar abalar e disse logo: Qual aparece! O que vós quereis é brincadeira! Não pode andar o patrão sem o moço!... Mas o caso é que a pequena se escapou sem se importar de nada... […] Eu […] pus-me a caminho, mais o meu José […] Íamos quase a entrar na Fátima […], quando comecei a ver os ares diferentes, tudo transtornado, e até foi na camisa do meu homem que comecei a dar pela coisa. […] Quando chegámos à igreja, disfarçou tudo. […] Calculámos depois que os ares se tinham começado a mudar, no mesmo tempo que a Jacinta e o irmão levassem, a correr, até chegarem aos Valinhos”23.
Manuel Pedro Marto, entrevistado pela mesma pessoa, não tem dúvidas sobre a data e conta a história do ramo da carrasqueira, que a sua cunhada, Maria Rosa, tinha contado em 1923: “Foi no dia 19 de agosto. Era domingo. E eu, só pela tarde, é que cheguei a casa. Quando ia já perto, encontrei o pai do vizinho Augusto que me diz assim: “Ó ti Marto! Então o milagre já está
21 Memórias da Irmã Lúcia, II, II, 11. Dada a diversidade de edições das Memórias da Irmã Lúcia, citamos a Memória com número ordinal, a parte, também com ordinal, e o capítulo com algarismo. 22 Memórias da Irmã Lúcia, IV, II, 6. 23 Maria de Freitas – A aparição dos Valinhos, em “Stella” (70) outubro de 1942, p. 14. A articulista, nas palavras de Teresa, emprega expressões populares, que atualizámos.
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mais aprovado?” [...]. Nossa Senhora tornou a aparecer aos seus cachopos, há bocado, nos Valinhos”. […] “Pois, sempre lhe digo, ti Marto, que a sua Jacinta tem uma virtude qualquer. Pelo visto, Nossa Senhora não apareceu, sem ela lá chegar. Esteve à espera dela!” Fui para casa, mas a pequena não estava. Sentei-me um bocado no arrebate da porta e depois fui para a cozinha e ali fiquei, sentado num banco, a pensar cá na vida. A mulher andava lá para fora, não sei se em visitas ou quê. Nisto, vejo a Jacinta na estrada, aos pulos, muito satisfeita, com um ramo de
carrasqueira na mão e, ao mesmo tempo que ela entra em casa, chega-me um perfume assim tão fino como eu nunca cheirei na minha vida. “Ó Jacinta, que é o que trazes aí?” – lhe perguntei – “É um ramo de carrasqueira dos Valinhos, onde Nossa Senhora apareceu, ainda há bocado!” – “Ora deixa cá ver!” Peguei no ramo, cheirei-o, mas nada: o perfume tinha
desaparecido! Pus-me então a lembrar-me daquelas palavras: – “Sempre a sua Jacinta tem uma virtude qualquer...” – “Tem então a certeza de que não foi no dia 15, dia em que as crianças chegaram de Ourém?”- pergunta a entrevistadora – “Toda a certeza!”24. O P. Luís Gonzaga da Fonseca e o Cónego Casimir Barthas datam a aparição de agosto: “quatre jours après le retour de Vila-Nova”25.
Terminamos este assunto da data, com uma resposta que a Irmã Lúcia deu, num questionário de Joseph Goulven, em 1946: “– A Aparição nos Valinhos foi a 16 ou a 19 de agosto? – Segundo o que dizia a minha mãe, que sabia contar, e eu não, deveu ser no dia 19”26.
Em conclusão: o regresso a Fátima foi no dia 15, dia de Nossa Senhora da Assunção, dia santo de guarda, e a quarta aparição, no dia 19, domingo27.
2. LOCAL DA QUARTA APARIÇÃO O sítio da aparição é referido como Valinho, no interrogatório do pároco de 21 de agosto28, no primeiro escrito autógrafo da Lúcia, de 192229 e na versão em primeira pessoa do interrogatório de 192430. Na restante documentação, logo a partir de 191731, o sítio é referido como Valinhos: no já referido interrogatório do Dr. Formigão, de 2 de novembro de 1917 e no estudo psicológico sobre os videntes32. A 6 de agosto de 1918, o pároco de Fátima repete o que tinha escrito em 1917: “No dia dezanove, que fora domingo, [Lúcia] andava a pastorear as ovelhas, no sítio chamado Valinhos”33.
24 Ibidem, p. 19. 25 FONSECA, Luís Gonzaga da, S. J., e BARTHAS, Casimir – Fátima: Merveille inouie, Toulouse, 1942, p. 57. 26 Em: REIS, S. M. – A Vidente de Fátima dialoga e responde pelas Aparições, Braga: Editorial Franciscana, 1970, p. 44. 27 Sobre a data da aparição de agosto de 1917, ver: COELHO, Messias Dias – O que falta para a conversão da Rússia, Fundão, 1959, p. 85-86; REIS, Sebastião Martins dos – Síntese crítica de Fátima: Incidências e repercussões, Évora, 1967, p. 72; IDEM - Fátima e os seus problemas – Qual a data exata da 4.ª Aparição nos Valinhos?, em: “A Defesa”, Évora, 45 (2331) 9 março 1968, pp. 1 e 7. Este último autor aceita o erro de Lúcia, ao falar do dia 16, em Vila Nova de Ourém, quando se sabe que regressou a Fátima, no dia 15: Carta do pároco “aos crentes e não crentes”: “P. S. – Chegou no dia 15 [de agosto] a autoridade com as crianças a minha casa, onde se ajuntaram os pais das mesmas e muitas outras pessoas, perante as quais pretendeu, com todas as amabilidades, explicar o seu modo de proceder” (DCF 1, Doc. 40, de 2 de setembro de 1917, p. 296, nota 20). 28 Documentação Crítica de Fátima (DCF) 1, Doc. 4, de 21 de agosto de 1917, p. 17. 29 DCF 3-3. Doc. 685, de 5 de janeiro de 1922, p. 268. 30 DCF 2, Doc. 8, de 8 de julho de 1924, p. 142. 31 DCF 1, Doc. 17, de 2 de novembro de 1917, pp. 169, 170 e 179. 32 DCF 1, Doc. 19, depois de 3 de novembro de 1917, p. 194. 33 DCF 1, Doc. 31, de 6 de agosto de 1918, pp. 262-263.
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O Sr. Manuel Pedro Marto, pai do Francisco e da Jacinta, em 1923, localiza, mais precisamente, a aparição: “ao chegar a casa, depois de ter passado pelos Valinhos, propriedade particular de António Ferreira Rosa, para ir a uma fazenda sua, ouviu dizer que Nossa Senhora tinha aparecido nesse dia, naquele sítio”34.
Na sua Sexta Memória, terminada a 25 de março de 1993, a Irmã Lúcia faz uma referência curiosa à sua mãe, relacionada com os Valinhos: “Quando o Administrador nos veio, de novo, trazer a Fátima e se deu a aparição nos Valinhos, a Mãe dizia: ‘Se essa Senhora vier agora, a aparecer aqui nos Valinhos, ainda é bom, porque, talvez, essa gente venha para aqui, e deixem de ir à Cova de Iria. Aqui nos Valinhos, não causam tanto prejuízo, porque não é terra cultivada’. Mas quando nos ouviu dizer que a Senhora nos tinha mandado continuar a ir à Cova de Iria, dizia: ‘Valha-me Deus, estamos na mesma! Nem os republicanos foram capazes de acabar com isto!’ ”35.
A carrasqueira ou pequena azinheira esteve protegida por um círculo de pedras, mas logo desapareceu, levada pelos fiéis, e, em 1956, foi junto dela edificado um monumento evocativo, com estátua da autoria de Maria Amélia Carvalheira da Silva.
3. MENSAGEM DESTA APARIÇÃO DOS VALINHOS A vidente Lúcia comunicou ao pároco, a 21 de agosto de 1917, as respostas de Nossa Senhora às suas perguntas: “Quero dizer-te que voltes lá à Cova da Iria; se não tivessem abalado contigo para a Aldeia [antiga Aldeia da Cruz, Vila Nova de Ourém], seria o milagre mais conhecido; havia de vir S. José com o Menino Jesus, dar a paz ao mundo; e havia de vir Nosso Senhor benzer o povo; vinha Nossa Senhora do Rosário, com um anjo de cada lado, e Nossa Senhora com um arco de flores à roda; aquele dinheiro, façam dois andorzinhos pequeninos; um, leva-o tu, mais três meninas como tu, e vão de branco; o outro leva-o o Francisco e mais três meninos como ele; levem uma capa branca, levem-no à Senhora do Rosário e apliquem-no a ela”36.
No processo paroquial, datado de 6 de agosto de 1918, o pároco repete, com pequeníssimas variantes: “Vinha Nossa Senhora do Rosário, com um anjinho de cada lado. Vinha Nossa Senhora das Dores, com um arco de flores à roda”37.
No interrogatório de 11 de outubro, o Dr. Formigão perguntou à Lúcia se, no dia 13 de outubro, “além de Nossa Senhora do Rosário, de S. José e o Menino, aparecem Nossa Senhora das Dores, com ramos de flores, Nosso Senhor, a abençoar o povo, e dois anjos”. Nos manuscritos do Dr. Formigão não foi anotada a resposta a esta pergunta. Eventualmente, pode não ter sido feita a pergunta38.
34 DCF 2, Doc. 4, de 28 de setembro de 1923, p. 68. 35 Memórias da Irmã Lúcia, VI, n.º 43. 36 DCF 1, Doc. 4, de 21 de agosto de 1917, p. 17. 37 DCF 1, Doc. 31, de 6 de agosto de 1918, p. 263. 38 DCF 1, Doc. 11, de 11 de outubro de 1917, pp. 86-87.
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O Dr. Formigão perguntou também à Jacinta, no dia 2 de novembro de 1917, o que Nossa Senhora tinha dito, na aparição de agosto. A vidente respondeu: viria “Nossa Senhora do Rosário com dois anjinhos, um de cada lado”39.
A Lúcia e a Jacinta estiveram na Reixida, freguesia das Cortes, Leiria, entre 14 e 27 de setembro, já depois da quinta aparição. O pároco, Padre António dos Santos Alves, entrevistou as duas e acrescentou, em dois depoimentos conhecidos, o pedido que Lúcia fez a Nossa Senhora de melhorar alguns doentes e de converter certas pessoas: “que se converteriam e melhorariam alguns, mas outros não, porque não acreditavam, e alguns nem sequer em seu (Divino) Filho40.
Maria dos Santos Carreira (mais tarde conhecida como “Maria da Capelinha”), depois de saber a resposta da Virgem sobre o destino das esmolas, pediu que Lúcia lhe falasse da intenção de se fazer aí uma capela. A resposta foi dada por Lúcia, à mesma e, também, a 27 de setembro, ao Dr. Manuel Nunes Formigão, que lhe fez a mesma pergunta: “Parte desse dinheiro seria destinado ao culto e festa da Senhora do Rosário e a outra parte para ajuda de uma capela nova”41 . O anúncio de um milagre, na aparição dos Valinhos, é realçado neste mesmo interrogatório, em que o Dr. Formigão perguntou se Nossa Senhora tinha feito “mais alguma revelação”. Lúcia “declarou que no dia 13 [de outubro], fará com que todo o povo acredite que ela realmente aparece”42.
A 8 de julho de 1924, aquando do interrogatório oficial que lhe foi feito, no Porto, Lúcia referiu que Nossa Senhora “disse que, no último mês, fazia um sinal no sol”43. O Padre José Pedro da Silva interrogou a Irmã Lúcia, em 1947, sobre este pormenor do sol: “A Irmã, no interrogatório
oficial [8 de julho de 1924], declara que Nossa Senhora, nos Valinhos, tinha dito que havia de fazer um milagre no sol... Tem a certeza de que Nossa Senhora disse: no sol? Nenhum documento mais antigo diz que fosse no sol”. A Irmã Lúcia respondeu: “Conservo uma vaga ideia”44. Efetivamente, nenhum documento anterior a 13 de outubro refere que o milagre prometido seria no sol. Na promessa das visões de S. José, Menino Jesus, Nossa Senhora das Dores e do Carmo, não se dava qualquer indicação onde é que seriam essas visões. Cremos que este foi um lapso compreensível de Lúcia, sete anos depois das aparições de 1917.
No interrogatório do Dr. Formigão, do dia 2 de novembro, a Jacinta lembrou o que Nossa Senhora tinha dito, na mesma aparição de agosto: “a Lúcia perguntou à Senhora se trazia o meu Manuel (um irmão da Jacinta que está servindo em Cabo Verde), e ela disse que trazia cá todos”45. Esse
39 DCF 1, Doc. 17, de 2 de novembro de 1917, p. 174. 40 DCF 1, Doc. 45, de 17 de setembro de 1917, p. 322. 41 DCF 1, Doc. 7, de 27 de setembro de 1917, p. 60. 42 DCF 1, Doc. 7, de 27 de setembro de 1917, pp. 60-61. 43 DCF 2, Docs. 6 e 7, de 8 de julho de 1924, pp. 134 e 143. 44 Interrogatório de 3 de julho de 1947, respondido a 1 de agosto, em: S. M. REIS – A Vidente de Fátima dialoga e responde pelas Aparições, Braga: Editorial Franciscana, 1970, p. 62. 45 DCF 1, Doc. 17, de 2 de novembro de 1917, p. 174. Manuel dos Santos Rosa, meio-irmão da Jacinta e do Francisco, prestou serviço militar em Cabo Verde, de 23 de janeiro de 1917 a 12 de dezembro de 1918.
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pormenor é referido também por João Santos, irmão do Francisco e Jacinta, que não se lembrava do que Lúcia disse, “a não ser a última pergunta, que foi se Ela trazia cá o meu Manuel”46.
No interrogatório oficial feito pela Comissão Canónica Diocesana, a 28 de setembro de 1923, Maria dos Santos Carreira fez uma declaração nova: “Nos Valinhos, perguntou a Lúcia à Senhora, a pedido da depoente, se Nossa Senhora tinha aparecido a mais alguém, na Cova da Iria, e a Senhora respondeu que não era ela, mas um anjo, o vulto que a Carolina, filha mais nova da depoente, de doze anos, e uma pequena de sete anos, de Espite, viram a vinte e oito de julho junto da azinheira, de pequena estatura, muito lindo, de cabelo loiro, vulto que depois a Carolina viu em cima da azinheira”47. O Padre José Pedro da Silva, em 1947, interrogou a Irmã Lúcia sobre esta declaração: “A tia Maria da Capelinha, assim chamada, diz, no depoimento oficial, e ainda hoje o confirma, que sua filha Carolina tinha visto um Anjo passear na Cova da Iria, e que pedia que rezassem três Ave-Marias... Que, depois, tinha pedido, à Irmã, que perguntasse a Nossa Senhora o que era “aquilo”; e que a Irmã, nos
Valinhos, tinha perguntado a Nossa Senhora, obtendo a resposta de que era um Anjo... O que há de verdade nisto? E a resposta da Irmã Lúcia foi: “Não sei, não me lembro de nada”48.
Na sua Quarta Memória, de 1941, a Irmã Lúcia diz, pela primeira e única vez, as últimas palavras de Nossa Senhora, nessa aparição de agosto de 1917: “Tomando um aspeto mais triste: Rezai, rezai muito e fazei sacrifícios por os pecadores, que vão muitas almas para o inferno, por não haver quem se sacrifique e peça por elas. E, como de costume, começou a elevar se em direção ao nascente”49. Compreende-se que a Irmã Lúcia só depois de ter revelado as duas primeiras partes do segredo, na aparição de julho50, tenha referido estas palavras de 19 de agosto de 1917.